quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Monja Coen - Mente vazia, mente tranquila








Alguns dizem que é preciso esvaziar a mente. Eu pergunto: como esvaziar o que já está vazio?

Há uma história Zen muito interessante. Certo dia um jovem aspirante pediu ao Mestre Zen que aquietasse sua mente. O Mestre disse:

- “Traga sua mente aqui, entregue-a a mim e eu a aquietarei.”

O jovem saiu procurando pela mente. Onde estaria? Seria pensamentos, memórias? Seria silëncios e quietude? Seria sonhos e pesadelos? Seria feita de palavras, conceitos? Seria apenas a massa encefálica, a matéria? O jovem pensava e não pensava. Cada vez que acreditava ter apanhado a mente, percebia que ela fugia, que já estava em outro pensamento, em outra idéia. Que o próprio conceito se desfazia. Cansado, voltou a procurar o Mestre e disse:

- “Senhor, é impossível apanhar a mente.”

O Mestre disse com alegria:

- “Pois então, já está aquietada.”

O jovem se reverenciou em profunda gratidão, pois pela primeira vez compreendia que a mente não é algo fixo e constante, mas flui com o fluir da vida, sem que possa jamais se fixar quer em inquietude ou em silêncio, quer em alegria ou tristeza, quer em iluminação ou delusão.

Outra história do século VII na China foi a seguinte: o abade de um grande mosteiro pediu a seus monges que fizessem um poema no qual expressassem sua compreensão dos ensinamentos de Buda. O Chefe dos Monges, muito querido e respeitado pelos seus mais de mil companheiros, escreveu solenemente:

“O corpo é a árvore Bodhi. A mente é como um espelho brilhante. Cuide para mante-la sempre limpa. Não permitindo que o pó se assente”

Um jovem semi-alfabetizado, que ajudava separando a palha do arroz viu o poema na parede, pediu que alguém o lessse e exclamou:

- “Não é isso”

E pediu a um monge letrado que escrevesse seu poema:

“O corpo não é a árvore Bodhi. A mente não é como um espelho brilhante. Se não há nada desde o princípio. Onde o pó se assenta?”

Este segundo poema reflete a essência dos ensinamentos do Sexto Ancestral da China, o Venerável Mestre Hui-neng e do Zen.

A prática da meditação do Zazen não é para polir o espírito, não é para limpar a mente, não é para esvaziar nada. É tornar-se uno com nossa essência verdadeira, com aquele Eu imenso que contem todos os sentimentos, emoções, percepções, formações mentais, consciência e a forma física.

Retornar à verdade e ao caminho é retornar à vida. Assim falamos em renascer. Deixar morrer idéias abstratas e fantasiosas sobre estar separado do tudo e dos outros e perceber a sabedoria suprema presente em todos os seres, vivenciá-la, tornar-se uno com todos os Budas e Ancestrais do Darma.

Basta perceber que nada é fixo, nada permanente – isto é o vazio. A mente vazia é aberta e flexível. Chora e ri. Pensa e não pensa. Não precisa ser esvaziada – já é vazia. Sendo vazia é clara e iluminada, em constante atividade e transformação.

Apenas escolha com o que alimentá-la. Você mesma(o) é o programa e o programador, o computador e seus acessórios. Cuide-se bem.

Doshin, o mestre zen considerado o Quarto Ancestral da China, disse:


“Todos os ensinamentos de Buda estão centrados na Mente, de onde incomensuráveis tesouros surgem. Todas as faculdades sobrenaturais e suas transformações reveladas na disciplina, meditação e sabedoria são suficientemente contidas em sua própria mente e nunca saem dela. Todos os obstáculos em obter-se bodhi surgem das paixões que geram carma e são originalmente não-existentes. Cada causa e cada efeito é apenas um sonho. Não há mundo triplo a abandonar nem nada a ser procurado. A realidade interna e a aparência externa do ser humano e das mil coisas são idênticas. O Grande Caminho é ilimitado e transcende a forma. Livre de pensamento e de ansiedade. Agora você entendeu o ensinamento de Buda. Não há nada faltando em você e você não é diferente de Buda. Não há outra maneira de obter o estado de Buda além de permitir sua mente ser livre em si mesma. Não contemple nem tente purificar sua mente. Deixe que não haja apego nem aversão, ansiedade nem medo. Esteja completamente aberta e absolutamente livre de todas as condições. Esteja livre para ir em qualquer direção que queira. Não aja para fazer o bem, nem procure o mal. Quer ande ou fique, sente ou deite, e seja o que for que aconteça a você, tudo são as maravilhosas atividades do Grande Iluminado. Tudo é alegria, livre de ansiedade – isto é chamado Buda.”


É preciso entender que estamos falando do ponto de vista do absoluto, de quem percebeu e se tornou o próprio corpo de Buda, que são em si os Preceitos, a Disciplina, a Meditaçao e a Sabedoria. Alguns podem interpretar erroneamente que fazer qualquer coisa é ação iluminada. Só se é Buda quando há a verdadeira compreensão do Caminho, que é tornar-se o Caminho de Sabedoria e Compaixão.

Não é ser bonzinho, nem querer ser mau. É tornar-se o próprio Bem.

Mente vazia e livre, clara e ativa em tranqüilidade, tranqüila em atividade.

Mãos em prece.
Monja Coen

Nenhum comentário:

Postar um comentário